segunda-feira, 22 de junho de 2009

Nova ortografia portuguesa

Marcelo Moraes Caetano
mmcaetano@hotmail.com
Escritor e professor de português e literaturas, tradutor de inglês, francês e alemão.


Acordo Ortográfico: seu principal objetivo

A língua portuguesa é o terceiro idioma mais falado - e, consequentemente, escrito - no mundo ocidental, ficando atrás, apenas, do inglês e do espanhol. Diante das rápidas modificações tecnológicas, que cada vez mais aproximam pessoas pelo mundo, é natural que cresça a preocupação com um dos principais veículos comunicativos de que os povos dispõem: A LÍNGUA ESCRITA. É exatamente esta a modalidade do idioma que está sendo enfocada pelas discussões relativas à nova ortografia.

O principal objetivo dessa tentativa de unificação das escritas, portanto, é facilitar o intercâmbio de informações que requeiram o uso da língua oficial. Visa-se, com isso, então, à melhora no fluxo das relações interpessoais que necessitem da língua normativa como intermediador comunicativo - de que são exemplos o comércio internacional, a publicação de artigos, a edição de livros, periódicos e similares, a confecção de contratos entre os países e assim por diante. Dessa maneira, é buscado o consenso no âmbito da elaboração de textos que, de alguma forma, por meio da escrita, devam percorrer as nações envolvidas e, nelas, ao longo do tempo, permanecer registrados.

Devemos lembrar, por fim, que as modificações propostas não irão erradicar as diferenças regionais dos países em questão, os PALOPS (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), membros da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) - a saber: Portugal, Brasil, Angola, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique, Guiné-Bissau e Timor Leste -, que têm Histórias próprias, com formações culturais distintas e riquíssimas. Mesmo dentro do nosso país, que possui dimensões continentais, as diversidades hão de permanecer, sem que, com isso, a preocupação com a unidade normativa se desfaça. O Acordo, pois, não é uma tentativa de igualar as múltiplas identidades culturais dos povos envolvidos, mas, sim, um esforço para que se diminuam as distâncias dentro da comunicação que tenha a língua escrita oficial como ferramenta necessária.

O trabalho a seguir cataloga não apenas as modificações ocorridas na ortografia da Língua Portuguesa a partir de 1 de janeiro de 2009, como também expõe e discute todo o novo paradigma ortográfico da língua a partir de então, fazendo-se referência também às regras que não foram alteradas com a sanção promovida pelo Decreto 6583, de 29 de setembro de 2008.

Como as grandes bases modificativas estão em torno da ORTOGRAFIA, ACENTUAÇÃO GRÁFICA e HÍFEN, foi exatamente em cima desses pontos que me detive.



***



PRIMEIRA PARTE: A ACENTUAÇÃO GRÁFICA NA LÍNGUA PORTUGUESA ATUAL



I – PROPAROXÍTONAS:



Todas serão acentuadas graficamente:

Árvore, límpido, álibi, cálice, físico, lépido, ônibus, tônico

OBSERVAÇÃO:

Manteve-se a flutuação de pronúncia e de acentuação tônica em certas palavras, que têm timbre aberto em Portugal e fechado no Brasil. Assim, aceitam-se como formas sincréticas, palavras proparoxítonas como:

Antônio/António
Tônico/ tónico
Fenômeno / fenómeno
Acadêmico / académico

II – MONOSSÍLABOS TÔNICOS:

São acentuados os terminados em A, E ou O, com timbre aberto ou fechado, seguidos ou não de S:

Pá, pé, pó, sê, dê, vê, quê

OBSERVAÇÃO:

Os verbos seguirão as mesmas regras, mesmo que haja ênclise ou mesóclise:


bebê-lo-á, pô-lo-á, pôs

ATENÇÃO:

Por clareza gráfica, as formas verbais monossilábicas terminadas em em, se da terceira pessoa do plural, serão acentuadas graficamente (acento circunflexo):



Ele tem / eles têm
Ele vem / eles vêm


assim como os verbos daí derivados, que, no entanto, não serão mais, obviamente, monossilábicos: eles detêm, eles provêm. Observe-se que as formas de 3. pessoa do singular receberão, nos verbos derivados, acento agudo: ele detém, ele provém; o que, repita-se, não ocorre com os monossilábicos nesta mesma pessoa. A acentuação gráfica destes verbos é assunto polêmico sob diversos pontos de vista, pois são utilizadas regras pertinentes a vários itens para se chegar a um consenso: ele tem (não acentuado por ser monossílabo não terminado em a, e ou o); ele detém (paroxítona terminada em em); eles têm/ detêm (acentos que servem de clareza gráfica, para que se difira esta forma da da 3ª pessoa do singular). Tornaremos ao assunto na parte em que tratamos da acentuação de algumas formas verbais específicas.

III – OXÍTONOS:

São acentuados os terminados em A, E, O EM (ENS), seguidos ou não de S:

Cajá, sapê, sofá, avô, avó, parabéns, refém, também, bebê-lo-ia, dispô-lo, amá-la, convém, amém

IV – PAROXÍTONOS

São acentuados os não terminados em A, E, O ou EM (ENS) seguidos ou não de S. Essa regra, mais prática, é, na verdade, correspondente a esta outra; são acentuados os vocábulos paroxítonos terminados em l, i, n, x, us, um, r, ã, ão, ps, om, on, seguidos ou não de s:

Vígil, cáqui, hífen, Félix, bônus, álbum, mártir, órfã, órfão, fórceps, rádom, códon etc.

OBSERVAÇÃO:

Não se acentuarão os paroxítonos terminados em -ens, uma vez que os oxítonos assim terminados o serão: hífen / hifens, pólen / polens , abdômen / abdomens etc.

Não se acentuam, embora segundo a regra devessem sê-lo, prefixos tais que anti-, nuper-, semi-, super-.

Repare-se que os vocábulos item e itens não são acentuados graficamente, este por ser paroxítona terminada em -ens (q.v. obs. abaixo), aquele por ser paroxítono terminado em -em. Se este vocábulo fosse acentuado no singular ou no plural, estes outros também o seriam: nuvem/nuvens; jovem/jovens (!).

ATENÇÃO:

Os vocábulos paroxítonos terminados em ditongo ou ditongo + M também são acentuados graficamente:

espécie(s), páscoa(s), régua(s) etc.

averíguo, averíguas, averígua, averíguam, averígue, averíguem etc.

OBSERVAÇÃO:

Há uma flutuação na pronúncia dos verbos terminados em guar, quar e quir, como averiguar, apaziguar, desaguar, enxaguar, obliquar, delinquir etc.

Esses verbos admitem dupla pronúncia em algumas formas do presente do indicativo, do presente do subjuntivo e também do imperativo.

Assim sendo, podem ocorrer duas circunstâncias:

1)Se forem pronunciadas com a ou i tônicos, essas formas devem ser acentuadas.

enxáguo, enxáguas, enxágua, enxáguam; enxágue, enxágues, enxáguem.
verbo delinquir: delínquo, delínques, delínque, delínquem; delínqua, delínquas, delínquam; averíguo, averíguas, averígua, averíguam, averígue, averíguem.

2) Se forem pronunciadas com u tônico, essas formas deixam de ser acentuadas.

(a vogal sublinhada é tônica, devendo ser pronunciada mais fortemente que as outras):

enxaguar: enxaguo, enxaguas, enxagua, enxaguam; enxague, enxagues; delinquir: delinquo, delinques, delinque, delinquem; delinqua, delinquas, delinquam; averiguo, averiguas, averigua, averiguam, averigue, averiguem

ATENÇÃO:

No Brasil, a pronúncia mais frequente é a primeira, com a e i tônicos.

V - DITONGOS TÔNICOS ABERTOS ÉI, ÉU, ÓI

1) São acentuados, QUANDO EM PALAVRAS OXÍTONAS:

chapéu, réis, papéis, heróis, mói.

2) EI e EU, mesmo quando abertos, não recebem acento gráfico quando em palavras paroxítonas:

ideia, europeia, joia, boia, apoia, heroico, estoico, ureia

VI - HIATOS

O i e o u orais precedidos de outra vogal, se formarem sílaba sozinhos ou com o s (hiato), serão acentuados graficamente: saída, saís, faísca, saúde etc.

Se o i ou o u forem nasais (seguidos de n, m ou nh) ou seguidos de l, r, z, i e u, formando sílabas com estes, não serão acentuados graficamente: ainda, bainha,ruim, paul, juiz (mas juízes), raiz (mas raízes), pauis.

Se a vogal átona for igual à tônica, dispensar-se-á, também, o acento gráfico: mandriice,vadiice,paracuuba.

OBSERVAÇÃO:

Se vierem em palavras paroxítonas, e precedidos de ditongo, o I e o U também deixam de receber acentuação gráfica:

feiura, Bocaiuva, janauira, baiuca, cauila

VII - HIATO DE ALGUMAS FORMAS VERBAIS

Não é mais acentuado o primeiro e do hiato -e/em das terceiras pessoas do plural dos verbos crer, ler, ver e dar, este último no presente do subjuntivo, aqueles três no presente do indicativo: creem, leem, veem, deem.

Também os hiatos o-o, dos verbos terminados no infinitivo em -oar, ou dos substantivos daí provenientes, deixarão de ser graficamente acentuados: perdoo, enjoo, voo (substantivo ou verbo), abençoo, doo etc.

OBSERVAÇÃO:

É claro que as terceiras pessoas do singular, por serem monossílabos tônicos terminados em e, receberão acento: crê, lê, vê, dê.

Não confundir com o verbo vir, que se grafa: ele vem, eles vêm

ATENÇÃO:

Passa a ser facultativo o uso do acento gráfico (agudo) na primeira pessoa do plural (NÓS) no pretérito perfeito dos verbos da primeira conjugação (vogal temática A)

Eu amei
Tu amaste
Ele amou
Nós amamos / amámos
Vós amastes
Eles amaram

Repare que esse acento não existirá no presente do indicativo

Eu amo
Tu amas
Ele ama
Nós amamos
Vós amais
Eles amam

Também se poderá usar, facultativamente, o acento gráfico (circunflexo) na primeira pessoa do plural (NÓS) do presente do subjuntivo do verbo DAR:

(que) eu dê
(que) tu dês
(que) ele dê
(que) nós demos / dêmos
(que) vós deis
(que) eles deem

VIII - ACENTO DIFERENCIAL

Não se usa mais o acento que diferenciava os pares pára/para, péla(s)/pela(s), pêlo(s)/pelo(s), pólo(s)/polo(s) e pêra/pera.

ATENÇÃO:

1) São mantidos os acentos que diferenciam os verbos pôde (pretérito perfeito) e pode (presente do indicativo)

2) O substantivo fôrma tem acento diferencial de timbre facultativo, para diferenciá-lo de forma, sempre de timbre aberto.

3) Continua havendo o acento diferencial de intensidade entre o verbo PÔR e a preposição POR.

IX – TREMA

É inteiramente abolido, somente subsistindo em nomes de grafias estrangeiras:

Tranquilo, cinquenta, quinquênio, eloquente, sequência, Müller


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SEGUNDA PARTE: O HÍFEN NA LÍNGUA PORTUGUESA ATUAL


Serão ligados por hífen os elementos formadores de uma palavra composta (por justaposição) ou derivada (por prefixação ou sufixação, este último caso um pouco menos freqüente), com os pré-requisitos de, naquela primeira circunstância: 1) manterem, ambos os elementos da palavra composta, individualidade fonética, isto é, de conservarem a acentuação tônica - e às vezes gráfica - originária (autonomia fonética); 2) manterem a forma gráfica com que figuram quando não componentes da palavra composta (autonomia gráfica e mórfica) e; 3) assumirem, após a junção, e mediante análise do conjunto, uma unidade de sentido distinta dos vocábulos originários quando individualmente analisados, sem que, naturalmente, esses vocábulos componentes se tenham esvaziado semanticamente por completo (dependência semântica).

Assim, entre inúmeros outros vocábulos, apresentarão hífen: água-marinha, arco-íris, guarda-roupa, porta-chapéus super-homem, bem-te-vi, cor-de-rosa, corre-corre, lusco-fusco, pátria-mãe, surdo-mudo etc.

Além disso, as novas palavras formadas devem ter explícitos os elementos que as compuseram, isto é, esses elementos devem apresentar, sincronicamente, livre curso na língua, o que equivale a dizer que deverá ser nítida a consciência do falante face à composição ou à derivação processada: bem-querer (mas benquisto), bem-vindo (Benvindo é antropônimo), bem-me-quer (mas malmequer), mal-amado, bem-amado etc. Notem-se as seguintes palavras: bendizer, bendito, maldizer, maldito, benfazejo, malfazejo, malfeito (mas bem-feito), má-formação (ou malformação), má-criação (ou, embora não registrado em todos os dicionários, apesar de notoriamente consagrado pelo uso, malcriação) etc.

Não obstante, haverá, de fato, certas regras secundárias que se deverão seguir, regras estas que, com efeito, não raramente infringem, e às vezes posto que de certa forma ampliando, os preceitos diretores acima expostos.

OBSERVAÇÃO:

Não se usa o hífen em certas palavras que perderam a noção de composição, como girassol, madressilva, mandachuva, pontapé, catavento, paraquedas, paraquedista, altofalante, arcondicionado etc. Há, no entanto, algumas dessas palavras quem se mantêm sincréticas, como alto-falante, ar-condicionado, cata-vento.

OUTRAS REGRAS

1) Os compostos cujos elementos provenham de alguma forma de redução fonética (seja abreviação, regressão etc.) receberão, de regra, o hífen: bel-prazer, és-sueste, su-sueste, recém-convertido, grã-fino, grão-mestre etc.

2) Sempre serão seguidos de hífen os seguintes elementos:

2.1) além-, aquém-, recém- (apócope de recente(mente) - cf. item 1), nuper-, sem-, grã- (apócope de grande - cf. item 1) e grão- (paretimologia; masculino suposto de grã [i]), vice-, vizo-, sota-, soto-: além-mar, aquém-fronteira (exceções: Alentejo, Aquentejo, alentejano, aquentejano; diante de topônimos, os prefixos se conservam separados: aquém Pireneus, além Pireneus etc.), recém-feito, nuper-publicado, sem-vergonha, grã-duquesa, grão-duque, vice-governador, vizo-rei, sota-vento, soto-capitão, sem-vergonha, sem-cerimônia, sem-terra etc.

2.2) ex- (com o sentido de ruptura de uma antiga condição): ex-ministro, ex-aluno, ex-presidente etc.

OBSERVAÇÃO: exportar, excomungar, expatriar etc. são formações apenas diacronicamente depreensíveis, além de o prefixo ex- significar, aqui, “movimento para fora” (equivalendo ao grego ec-; q.v. nosso trabalho sobre prefixos gregos e latinos e suas equivalências). Em certas expressões latinas, ainda aparece o elemento, tendo, em alguns casos, o hífen, e, em outros, não (num caso ou noutro, ler-se-á /eks/): ex-corde (fórmula de cortesia com que se fecham cartas a pessoas íntimas), ex-abrupto (= de repente), ex-officio (por dever do cargo, “ossos do ofício”), ex adverso (o advogado da parte contrária), ex aequo (segundo os princípios da equidade) etc.

2.3) pós-, pré-, pró- (naturalmente apenas quando tônicos): pós-moderno, pré-histórico, pró-juventude, pró-europeu, pós-graduação, pré-vestibular. Se átonos, escrever-se-ão os prefixos sem hífen: pospor, preestabelecer, promagistrado, preocupar, preopinar, prefigurar etc.

OBSERVAÇÃO: Atente para a diferença entre pré-fixar, isto é, “fixar com antecedência” e prefixar, isto é, “apor um prefixo”, ou “dar forma de prefixo”.

2.4) ad-, com palavras iniciadas por d ou r: ad-digital, ad-renal

2.5) sub-, com palavras iniciadas por b ou r: sub-base, sub-região, sub-reptício

ATENÇÃO: Além dos prefixos AD e SUB, também os prefixos AB, OB e SOB serão seguidos de hífen quando estiverem diante de palavra iniciada por R. Isso será mostrado adiante, quando tratarmos dos prefixos e o hífen:

sub-região
sub-raça
sub-reptício
ab-rogar
sub-reitoria
ab-rupto (ou abrupto)
ob-reptício

2.6) co(m)-, em formações muito recentes: co-fundador, co-proprietário, co-piloto, co-seguro, co-administração etc. Podemos dizer, no entanto, que as formas já de há muito consolidadas na língua não recebem, ainda hoje - porque dessa forma tiveram sua gênese -, o hífen: coabitar, coabitação (MAS: co-habitação, forma sincrética), coadjuvar, coadjuvante, coirmão (confrade em ordens religiosas; ou primos, filhos dos irmãos), coadjutor, coobrigar, coobrigação, coexistir, correlação, cooperar, cooptar, coocupante, coordenar, colidir.

Com efeito, para que se separem prefixo e vocábulo com hífen, é preciso que se reconheça ser o co-, de fato, um prefixo, indicando, como vimos, concomitância, comunidade; desse modo, não se extrairá nunca um prefixo, por exemplo, de cochinês, que, ao contrário do que poderia aparentar, não se refere a alguém simultaneamente (a alguma outra coisa) chinês, mas, sim, a alguém proveniente da Índia, mais especificamente de Cochim, vocábulo este em que se desconheceria, modernamente, qualquer prefixação, ainda que tenha havido, e ainda que, na sua origem, tenha-se de fato referido a alguém simultaneamente chinês, o que, hoje, não interessa.

2.7) As formas adjetivas ou substantivas compostas, reduzidas, pátrias ou não, desde que os elementos sejam todos da mesma classe: ínfero-anteriores, ântero-dorsais, súpero-posteriores, póstero-palatais, político-econômicos, médico-clínico-cirúrgico, histórico-geográficos, greco-romanos, anglo-germânicos, afro-descendente etc.

3) Elementos sempre precedidos de hífen:

3.1) Elementos, atuando como sufixos, provenientes de adjetivos tupi-guaranis como: -açu, -guaçu, -mirim: capim-açu, amoré-guaçu, anajá-mirim etc.

OBSERVAÇÃO: O sufixo -mor é sempre seguido de hífen (q.v. item 3.3, abaixo). “Já com guaçu e mirim”, diz-nos Valter Kehdi (Formação de palavras em português, 2. ed., São Paulo, Ática, 1997, p. 29), “a condição é que o primeiro elemento termine em vogal nasal ou acentuada graficamente: maracanã-guaçu / socó-mirim”.

3.2) Os pronomes oblíquos:

3.2.1) Em posições enclítica e mesoclítica (nesta última, o hífen também ocorrerá após o pronome): dar-se-nos-á (combinação de dois pronomes), bebi-o, comê-lo-ia, dar-lhe-ei etc.

3.2.2) Servindo de objetos diretos contraídos com os pronomes nos e vos:

no-lo(s), vo-lo(s), no-la(s), vo-la(s).


3.2.3) Após a expressão eis: ei-lo(s), ei-la(s).

OBSERVAÇÃO: Repare-se que haverá perda do S final de EIS.

3.3) -mor, sufixo sinônimo de “maior”, de que é redução fonética: altar-mor, guarda-mor etc. (Q.v. item 3.1.)

3.4) O substantivo “feira” nos dias da semana: segunda-feira, terça-feira.

OBSERVAÇÃO: A simplificação, prática que se vem estendendo entre nós, sobretudo na imprensa escrita (e mesmo na falada), dada a exiguidade do espaço e do tempo consagrada a essas imprensas, não pede, ao menos neste caso (com os dias da semana), hífen. Portanto, não se escreverá, ao se incorrer na simplificação aludida: segundas- e terças-feiras, mas, sim, segundas e terças-feiras. A simplificação vocabular é prática comuníssima entre os alemães, não devendo ser irrestrita e desregradamente adotada pelos falantes da língua portuguesa. Encontramos em Gilberto Mendonça Telles (in Modernismo brasileiro e vanguarda européia) a seguinte frase, por nós grifada nos dois momentos: “(...) e movimento (...) que pôde mais rigorosamente sondar a sub- ou a super-realidade da alma humana.” Muito se tem lido acerca de “macro e microcosmo” etc., etc. Se se for pródigo nesta prática, insistimos, não tardarão frases como: “é preciso avaliarmos as ex e as importações brasileiras”, em que, além do acento intelectual recaindo sobre os prefixos, para evidenciá-los, haverá a própria elipse concreta do radical comum da palavra, como se este fosse, visto que notório (de fato), um elemento secundário, de somenos valor. Evanildo Bechara, analisando os casos em que há complementos de termos de regências diferentes (LPAS, 64), arrola: ele era super e arquimilionário, utilizando a expressão por nós admitida válida: simplificação.

4) Formas obsoletas de artigos definidos:

4.1) O antigo artigo el, posto que verdadeiramente desusado, dever-se-á prender ao substantivo rei: el-rei.

4.2) A forma lo aparece, com suas flexões, ainda que mui exiguamente, junto a mais, caso em que se usará hífen: mai-lo (= mais o); v.g.: “Veio da terra, mai-lo seu moinho” (A. Nobre, apud Cunha-Cintra, 200).

Também nos chegou, de Graciliano Ramos (apud Lapa, ELP, 157) “Difícil imaginá-las (= imaginar as) frações de pessoas, misturadas, decompondo-se num monturo” (Infância, ed. 1945, pág. 196). Lapa arremata:

É aliás o processo do galego atual, retintamente popular: “Vai levá-lo neno ao médico”. (id. ib.)
5) Compostos semânticos vocabulares que denotam encadeamentos topográficos, geralmente geográficos:

Conexão Beirute-Bagdá
Ligação hidrogênio-carbono
Eixo Rio-São Paulo
Ponte Rio-Niterói

6) Deve-se usar o hífen na separação silábica:

Car-ro-ce-ri-a
Mar-su-pi-al

OBSERVAÇÃO: Na translineação, usa-se também o hífen. Por uma questão de clareza gráfica, deve-se usar o hífen nas duas linhas do vocábulo separado se, no local onde houve a separação, ocorresse originalmente o hífen;

Super-homem / Super-
-homem

Dê-me / Dê-
-me

7) PREFIXOS PSEUDOPREFIXOS E O HÍFEN:

OBSERVAÇÃO: Chama-se pseudoprefixo aquele elemento que, tendo origem num radical vernáculo, passou a comportar-se de modo idêntico, para efeitos morfológicos, aos prefixos comuns, configurando o que Celso Cunha chama de RECOMPOSIÇÃO:

Assim, no pensamento contemporâneo, os pseudoprefixos abaixo apresentam tais significações:

AUTO (= carro)
AERO (= avião)
HIDRO (= água)
HOMO (= homossexualidade)
Etc.

Note-se que, originariamente, AUTO é sinônimo de PRÓPRIO; AERO de AR; HIDRO de HIDROGÊNIO; HOMO de SEMELHANTE etc.

Assim, são casos de recomposição, com pseudoprefixos: AUTOESPORTE (não “esporte próprio”, mas “esporte de carro”), AEROPORTO (não “porto no ar”, mas “porto de avião”), HIDRÓFILO (não “amor ao hidrogênio”, mas “amor à água”); HOMOFOBIA (não “aversão ao semelhante”, mas “aversão ao homossexual”).

A) Qualquer prefixo será seguido de hífen quando estiver diante de palavras iniciadas por H:

anti-higiênico
anti-histórico
co-herdeiro
macro-história
mini-hotel
proto-história
sobre-humano
super-homem
ultra-humano

EXCEÇÕES: subumano, desumano, inábil etc.

B) PREFIXOS TERMINADOS EM VOGAL

B.1) Usa-se o hífen quando o prefixo termina em vogal e a palavra seguinte começa com vogal idêntica:

anti-ibérico
anti-imperialista
anti-inflacionário
anti-inflamatório
auto-observação
contra-almirante
contra-atacar
contra-ataque
micro-ondas
micro-ônibus
semi-internato
semi-interno

B.2) Não se usa o hífen quando o prefixo termina em vogal e a palavra seguinte se inicia com vogal diferente:

aeroespacial
agroindustrial
anteontem
antiaéreo
antieducativo
autoaprendizagem
autoescola
autoestrada
autoinstrução
autoanálise
coautor
coedição
extraescolar
infraestrutura
plurianual
semiaberto
semianalfabeto
semiesférico
semiopaco

B.3) Não se usa o hífen quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa com R ou S. Neste caso, duplica-se o R ou o S:

antirrábico
antirracismo
antirreligioso
antirrugas
antissocial
biorritmo
contrarregra
contrassenso
cosseno
infrassom
microssistema
minissaia
multissecular
neorrealismo
neossimbolista
semirreta
ultrarresistente
ultrassom
ultrarromantismo

B.4) Não se usa o hífen quando o prefixo termina em vogal e o segundo elemento começa com consoante diferente de R ou S.

anteprojeto
antipedagógico
autopeça
autoproteção
coprodução
geopolítica
microcomputador
pseudoprofessor
semicírculo
semideus
seminovo
ultramoderno

C) PREFIXOS TERMINADOS EM CONSOANTE

C.1) Usa-se o hífen quando o prefixo termina em consoante e o segundo elemento começa pela mesma consoante.

hiper-requintado
inter-racial
inter-regional
sub-bibliotecário
ad-digital
super-racista
super-reacionário
super-resistente
super-romântico

C.2) Não se usa o hífen quando o prefixo termina em consoante e o segundo elemento começa com consoante diferente:

Supermercado
Intermunicipal
Supersônico

C.3) Não se usa o hífen quando o prefixo termina em consoante e o segundo elemento começa por vogal.

hiperacidez
hiperativo
interescolar
interestadual
interestelar
interestudantil
superamigo
superaquecimento
supereconômico
superexigente
superinteressante
superotimismo

ATENÇÃO: Com o prefixos SUB, AB, AD, OB e SOB usa-se o hífen também diante de palavra iniciada por R, conforme havia sido mostrado acima

sub-região
sub-raça
sub-reptício
ab-rogar
sub-reitoria
ab-rupto (ou abrupto)
ob-reptício

OBSERVAÇÃO: Com os prefixos circum e pan, usa-se o hífen diante de palavra iniciada por M, N e vogal:

circum-navegação
pan-americano

RESUMO: PREFIXOS E HÍFEN

1) Sempre se usa o hífen diante de H:

anti-higiênico, super-homem.

2) Prefixo terminado em vogal:

2.1) Com hífen diante de mesma vogal:

contra-ataque, micro-ondas.

2.2) Sem hífen diante de vogal diferente:

autoescola, antiaéreo.

2.3) Sem hífen diante de R e S. Dobram-se essas letras:

antirracismo, antissocial, ultrassom.

2.4) Sem hífen diante de consoante diferente de R e S:

anteprojeto, semicírculo.

3) Prefixo terminado em consoante:

3.1) Com hífen diante de mesma consoante:

inter-regional, sub-bibliotecário.

3.2) Sem hífen diante de consoante diferente:

intermunicipal, supersônico.

3.3) Sem hífen diante de vogal:

interestadual, superinteressante.

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[i] Daí, em Herculano, em sua obra O Bobo, encontrarmos o feminino -grão, que, no entanto, na edição Clássicos de Ouro, da Edições de Ouro, Rio de Janeiro, s/d, Introdução de Josué Montello, p. 86, está sem hífen: Apraz-te, meu sobrinho, o ver esta grão peça de cavaleiro (...). E também em Camões (Edição d’Os Lusíadas comentados por A. Epifânio da Silva Dias, reprodução fac-similada da 2. ed., Ministério da Educação e Cultura, 1972, p. 194 - III, 114-115): Com tanta mortindade, que a memoria / Nunca no mundo vio tão grão victoria. Aliás, é de certa forma contundente o uso dessa forma apocopada de que vimos tanto tecendo comentários. Em Rubem Braga, por exemplo (O Sino de Ouro, in Elenco de Cronistas do Modernismo, 15. ed., Rio de Janeiro, José Olympio, 1997, p. 53), vemos: Lembrança de antigo esplendor, gesto de gratidão, dádiva ao Senhor de um grã-senhor (...).”


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990

Decreto 6583, de 29 de setembro de 2008

ACADEMIA Brasileira de Letras. Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro. A Academia, 1998

BECHARA, Evanildo. Gramática Escolar da Língua Portuguesa1. 1. edição. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004

HENRIQUES, Cláudio Cezar. A nova ortografia. 1. edição. Rio de Janeiro: Campus-Elsevier, 2008

HOUAISS, Antônio. A nova ortografia da Língua Portuguesa. São Paulo: Ática, 1991

------------- Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006

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